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Textos
Das coisas que eu sei

Quando eu era criança fui em um planetário pela primeira vez e conheci várias estrelas, de todas decorei o nome de apenas uma: Antares. Na minha mente infantil tinha certeza de que aquela estrela brilhava por minha causa. Quando acontecia qualquer coisa um pouco mais difícil de lidar, eu ia para a rua e procurava por ela. Eu falava com ela. Tinha certeza que o bem estar e a certeza da melhora eram por isso. Por ela. Não sei exatamente quando deixei de acreditar. Nem sei se. A questão é: por quê deixamos de acreditar?
Tenho um amigo que, quando criança, achava que controlava o tempo. Funcionava assim, quando estava muito frio ele vestia uma regata, pois assim o tempo entendia que na verdade era para estar calor, e então ficava quente. Se estava muito calor, ele vestia casacos, e o tempo entendia que devia estar mais frio. E se tornava frio mesmo! Em um dia muito quente, ele vestiu sua blusa de frio e sua mãe o viu. Disse a ele para tirá-la e ele contou à ela tudo sobre seus poderes. Não sei o que a mãe lhe disse, mas segundo ele, desde então os poderes sumiram.
Sempre que meu irmão mais novo fazia alguma coisa improvável ou muito engraçada ele mostrava para a minha mãe ela não dava muita atenção. Então ele parou de mostrar. Depois de um tempo parou de fazer.
Não sei quem foi que me disse ou se apenas ouvi, mas quando eu tinha uns 10 anos escrevia poemas sobre tudo e qualquer coisa, eu tinha certeza que era o meu talento maior do mundo, mas parei. Até uns 17 não ousei escrever poesia. Alguém disse que aquilo não dava dinheiro. Por deus! Eu era criança, eu nem precisava de dinheiro! Por quê isso mexeu comigo? Por quê acreditávamos em qualquer bobagens que aquelas “pessoas grandes” nos diziam? Perceba que é a energia do que se diz e as palavras não importam tanto. Aquela parada de intenção. Criança sente tudo, tá?
Vocês repararam que as coisas perdiam as possibilidades quando eram contadas aos adultos? Nós éramos água corrente e eles eram pedras. É óbvio que podemos dar a volta e seguir, mas considere que essas pedras são seus pais e eles são as pessoas que mais importam para você. Mesmo sendo natural mover-se, a gente vai parando, a gente vai acreditando que segurança e realidade são melhores do que risco e imaginação (SOCORRO), a gente vai virando pedra.
Tudo que eu disse é para dizer que agora eu sou adulta. Às vezes sou quase pedra. Existe um ímpeto de dizer vários nãos quando as crianças e adolescentes ao meu redor querem umas coisas “impossíveis”. E considerando quem sou e o que faço e ainda quero fazer da minha vida, minha mente não deveria reconhecer impossíveis, mas é um pensamento automático, eu repito o que aprendi.
Às vezes escondo de mim mesma os meus sonhos para que não desacredite deles quando eu souber. Uma voz dentro de mim sabe o que “dá dinheiro” e o que não dá. Uma voz dentro de mim sabe o que as pessoas na minha família fazem e me diz que eu deveria fazer o mesmo. Uma voz dentro de mim diz não só que a maçã não cai longe da árvore, mas que ela não pode rolar para longe depois também. Essa voz é alta e gritante. Mas existe uma outra, uma voz de estrela, bem ali no meio da constelação de escorpião, dizendo calmamente que fui feita para ir longe. Me permitindo fluir. Dizendo para ser quem eu sou. Água.
Letícia de Queiroz
Enviado por Letícia de Queiroz em 06/07/2018
Alterado em 24/09/2018
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